28 dezembro 2016

Imãs

Quando vi a queima de fogos de artifício, fechei os olhos e pedi “que eu consiga sobreviver”. Nos últimos sete anos eu faço esse pedido e o coloco como a meta da minha vida. Nunca peço mais que isso. A verdade é que se a gente sobreviver, podemos fazer metas, planos e dar os primeiros passos.

 A única certeza que tinha era sobre o meu trabalho, sobre a faculdade, sobre ser uma pessoa  melhor. Depois da virada do ano abracei meus pais, peguei uma garrafa de vinho e entrei em  um carro para ver meus amigos. Eu também tinha certeza sobre eles. Dançamos, disputamos ventiladores, as risadas eram altas e lindas e o que senti ali era mais do que uma reunião, mais do que uma celebração. Eu me encaixava, eu fazia parte. Eu agradeci por estar ali. Eles não sabem, mas os imãs na geladeira de um amigo me fizeram refletir – eu juro que ainda estava sóbria – sobre o que eu queria fazer em 2016.

O que eu queria? “Esse imã de Portugal me faz lembrar que eu deveria viajar e conhecer outras pessoas.” O imã da Espanha me lembrou a frase “mi casa, su casa”, eu deveria ser mais generosa e de alguma forma abrir os braços para acolher as pessoas. Fiquei alguns minutos relacionando imãs de geladeiras ao o que deveria fazer em 2016. Ok, eu já não estava mais sóbria. Eu não me lembro de mais nada quando saí de perto da geladeira, mas provavelmente estava tentando pular o muro da minha casa mesmo com as chaves na mão. Afinal, as festas terminam com a minha pessoa querendo pular o muro da minha casa. Essa atitude ocasional pode revelar quem eu era em outras reencarnações.


Em janeiro de 2016 eu fui atropelada na faixa de pedestre. Em fevereiro de 2016 meu pai se descuidou e perdeu  os dois remos do barco no meio do Rio São Francisco, mas minutos depois eles voltaram. Em abril de 2016 fui atormentada pelo ensino médio depois de dez anos. Nos últimos meses estou fazendo exatamente o que desejei no ano novo. “Eu quero sobreviver.” E estou. Sem trapaças, sem falar mal das pessoas – desconfie de quem fala mal de outras pessoas para você  –  e arcando com as  consequências das escolhas que fiz. Eu continuarei sobrevivendo.